Ultrascores

 

Pássaros, assobios, conversas, paradas, discursos… — tudo isto constitui material para o francês de ascendência martinicana Christophe Chassol (1976, Paris) que, num espetáculo de sincronização magicamente irrepreensível, articula vídeo, som e acompanhamento instrumental em tempo real.

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Do you want to make a noise? Yes? Make one.

.                                                                                        Cornelius Cardew. 1968. Scooltime Special – B

Instruções de Execução

Notas à margem do workshop Partituras verbais: Ver e Fazer, por Sérgio Abdalla, entre 17 e 19 de Julho de 2018, na Lisboa Incomum.

Partitura é geralmente definida nos dicionários como um suporte gráfico para (a)notações inscritas/ impressas, construindo uma composição que será depois interpretada e traduzida em som. 
A amplitude de abertura desta descrição é tal, que este mesmo post poderia ser considerado, em sentido lato, uma partitura; contudo — galgando aqui a historiografia da notação musical —, este será o aspeto convencional de uma partitura de “música erudita contemporânea” :

Heinz Holliger. 1981. Estudo II para Oboé [excerto]

Esta é a linguagem que a maioria dos músicos está habituada a ler . Mas há sempre momentos onde — em maior ou menor medida — as fronteiras são desafiadas, criando problemas de leitura e interpretação, clivagens de correspondência entre significante e significado, entre o ‘comando’ gráfico e a imagem sonora a reproduzir. 

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Partituras verbais

Entre os dias 17 e 19 de Julho de 2018 será dado um workshop com o título “Partituras Verbais”. A iniciativa está a cargo do Festival Dias de Música Electroacústica (DME) — fundado em Seia pelo compositor Jaime Reis — e terá lugar na Lisboa Incomum.
Sérgio Abdalla orientará as sessões. Formado em composição eletroacústica, defendeu, em setembro 2017, na Universidade de São Paulo, a dissertação de mestrado Partituras verbais e sua relação problemática com a música.
Mais informação em: http://www.festival-dme.org
 

Yapp Yapp!!

Jaap Blonk (born 1953 in Woerden, Holland) is well-known in the rich niche of strange voices. 
Ursonate (1986) and Flux De Bouche ‎(1993) launched him in the international world of vocal experimentation. The turn of the century heard him turning-tables and mixing electronics…

Despite all the commitment, sound poetry is still a strange place:

Vox Media  through HIPOGLOTE — had the chance to hear Blonk’s testimony and the privilege of some live-improvised pieces.
Let’s hear him:

Voz ao Canto

Afinal, por que é a voz extraordinária?

…a voz — tal como na fábula de Esopo —subjetiva aquele que a emite, mesmo que seja um animal. A voz pertence aos vivos; ela comunica a presença de um ser em carne e osso; assinala uma garganta, um corpo em particular.
Adriana Cavarero (2005: 177) [trad.TS]

É de facto admirável que um instrumento com características em geral semelhantes — pulmões, traqueia, laringe, boca…— possa ser representado por tantas faces e tomar simultaneamente um lugar tão específico na nossa perceção. A sua presença ou emissão adquire tal amplitude que se torna necessário atribuir um enquadramento. Quão amplas são as facetas do esgar vocal? Quantos ouvidos tange à sua passagem? Quais os limites de um órgão tão velho quanto a existência humana? 

O lugar da voz emana diferentes paisagens; no sentido “azguimiano”, a voz extraordinária resulta de um desafio lançado a compositores e intérpretes, ao rolar da ‘música erudita contemporânea’, das obras que colocam o elemento extraordinário (piano, percussão, voz… consoante a temporada) em destaque ou em cheque. O seu lado oculto é (com)posto a nu pela mão do programador da temporada, Miguel Azguime.

São quatro as vozes extraordinárias, 4 recitais integrados nas Festas de Lisboa 2018 durante o mês de Junho, nos dias 22, 23, 29 e 30 às 21h30 no O’culto da Ajuda, protagonizados por Katia Guedes, Marina Pacheco, o Duo Savina Yannatou e a pianista Joana Sá, e o Duo Tágide com Inês Simões e o pianista Daniel Godinho.
No O’culto da Ajuda, Travessa das Zebras, 25.

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Visual-Vocal: Oficina com Américo Rodrigues

visual vocal 1-2

“Il faut pulvériser notre langage usé — c’est-à-dire faire scintiller le mot” (Pierre Garnier )

Basta um breve mastigar de palavras e sons, qual ritual de feitiçaria ou golpes de tacão no país de Oz, e eis que se nos apresenta o vasto reino da poesia sonora. O Grande Américo dá o mote; a partir daí, sem grandes explicações, cada um solta ou tange as cordas vocais à sua maneira. A inibição desaparece lesta e a voz começa a saltitar por caminhos que emprestam nova expressão às lamúrias quotidianas.
Como seria o nosso dia-a-dia se ao falar entoássemos com as bochechas o ranger dos dentes e o bater dos lábios, o assobio da língua e o apertar da garganta? O potencial vocal absorve qualquer recurso normalmente aplicado noutras funções (beber, mastigar, etc.): aqui tudo é valência sonora.
Algo de inesperado e maravilhoso acontece: incríveis vozes de capacidades extravagantes emergem subitamente — que gozo seria um mundo comunicante em poesia sonora…!

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(manu)(voce)(post)scriptum

Als das Kind, Kind war…

Homero senta-se, cansado, após ter subido uns poucos degraus. Os anjos passam por ele, ignorando-o. Colocam-se estrategicamente nas mesas ocupadas. Abraçam ao de leve os leitores. Outros encostam-se à balaustrada inclinando o pescoço. Algo se prepara. Candeeiros de latão repetem uma luz amarela. A imagem ampla sobe até aos altos tetos da estrutura. Ouve-se um murmúrio crescente. Começa a cena da Biblioteca.

Estudiosos de várias nacionalidades concentram-se, em silêncio, absorvidos pela leitura. Mas nós e os anjos ouvimos o marulhar incessante. Uma mescla de vozes – as vozes interiores dos leitores em silêncio na biblioteca de Berlin – expõe de forma invertida o silêncio da leitura que é hoje apanágio de qualquer biblioteca. Nem sempre foi assim: na Alta Idade Média blocos murmurantes envolviam os letrados, desfiando longos textos de memória. Hoje, fragmentos manuscritos asseguram essa construção histórica – só os anjos sabem efetivamente o que se passava nas salas dos escribas.

bibliothek 3

PLAY: Jürgen Knieper. 1987. Die Kathedrale der Bücher. Banda sonora para o filme Der Himmel Über Berlin / Wings of Desire de Wim Wenders:

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«todos fazemos poesia fonética no dia-a-dia»

Fragas Falantes / Speaking Stones 1996-2016 dão expressão a duas décadas de trabalho gráfico do (não só) tipógrafo Jorge dos Reis, a par da Exposição “20 anos 20 tipos de letra” patente na Faculdade de Artes e Letras da Universidade da Beira Interior na Covilhã.

Jorge dos Reis (Unhais da Serra, 1971) é o autor de três importantes tomos sobre O Desenho da Escrita em Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal, 2012), destacando-se também a sua colaboração com Américo Rodrigues: Trânsito Local Trânsito Vocal (2004, cd-áudio).

Nos seus tempos de estudante, pendulava entre as Belas Artes e o Conservatório Nacional, onde frequentou canto, bem como aulas de Jorge Peixinho.

Esta duplicidade serviu de leitmotiv à conversa na sala 401 da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa no passado dia 25/10/2016. A entrevista passou no Hipoglote, programa de poesia sonora da Rádio Universidade de Coimbra (RUC) que podem voltar a escutar.