nome de gente, melodia de pássaro

Verdilhão (carduelis chloris)

Verdilhão/ carduelis chloris (2009-04-02), em Dwingelderveld, Drenthe, Holanda, gravado por Sander BOT (xeno-canto)

Mas o ar tinha uma certa graça e, se bem que a ornitologia do trilo fosse discutível, será que não valia mais a pena começar a aprendizagem de [‘ʒwɐ͂w̃] com um chilrear acessível para depois o encerrar num trilo único de onde nunca mais sairia? (VILLEMAUX 2019, 13)

O primeiro número (#0) de Coreia (fevereiro de 2019) foi lançado na Rua das Gaivotas 6 em Lisboa no passado dia 24 de fevereiro de 2019 e inclui um texto de Cyriaque Villemaux (1988, Offenburg, DE) – “Enfanter le père” (“Inventar o pai”, na tradução de Vieira Mendes) – que parte da “ideia segundo a qual nós também herdamos dos nossos sucessores”.

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(a-)sincronias ao despique

Flora Détraz: Muyte Maker 

Quatro raparigas sentadas a quatro mesas, tampos no escuro, pernas reluzindo oito meias brancas em V. Ajeita-se o público, inverte-se a iluminação e o ângulo, agora circunflexo, dos braços às palmas das mãos nas bochechas. Na cabeça, ‘chapéus’ de fruta prolongando-se na trança de cabelo puxada por uma corrente ao alto das barras da iluminação, pendendo mais atrás em contrapesos sui generis: um martelo, um cutelo, uma foice e um saca-rolhas gigante.

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O Som e o Corpo: Duas Partituras Paralelas

FLORA DÉTRAZ ou A Bailarina Com Voz

Luz encadeando o público, fundo preto raiado a entreluz que uma silhueta faz oscilar e entrechocar ao entrar, procuramos no escuro, emerge sentada uma figura de amarelo que nos fixa. Um contínuo som [canto multifónico] grave e a sua repartição em harmónicos situa-se/-nos — quase coincide — algures na rapariga sentada, mas ela permanece imóvel. Subitamente inclina o corpo e vira a face, como se ela própria escutasse, procurasse a fonte sonora; a garganta revela o ataque à nota fundamental, mas todo o rosto queda impassível. Esta cena é lenta, protocolar, como o exige a ritualidade musical. A nota acelera, a língua interfere em jogo oclusivo e alveolar,  e do corpo inclinado para a frente pinga um fio de saliva, a exteriorização líquida e aprumada do caos interior.

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